Faleceu Frei Jorge de Negreiros

Escrito em 14/12/2024

Nos primeiros minutos deste dia 14 de dezembro de 2024, na Fraternidade do Amial, no Porto, partiu em paz para a “Casa do Pai” o Frei Jorge de Negreiros.

Frei Jorge de Negreiros

(António Seara de Campos)

1928-2024

Nos primeiros minutos deste dia 14 de dezembro de 2024, na fraternidade dos Franciscanos Capuchinhos do Amial (Porto), partiu serenamente e em paz para a “Casa do Pai” o nosso querido irmão Frei Jorge de Negreiros. Contava 96 anos de vida e 79 anos de Profissão Religiosa.

No dizer do Guardião do Amial, Frei Fernando Alberto, "desde o Céu, é mais um santo capuchinho a mostrar-nos o caminho da fidelidade à nossa vocação sustentada por uma forte vida de oração e sentido de fraternidade".

Frei Jorge de Negreiros (António Seara de Campos) nasceu na freguesia de Negreiros, concelho de Barcelos, a 2 de novembro de 1928, terra minhota que tem dado muitas vocações à Ordem Capuchinha.

Juntamente com o saudoso Frei D. Francisco da Mata Mourisca, tomou o santo hábito religioso no Convento de Santo António de Barcelos a 13 de Agosto de 1944, emitiu a profissão temporária em 15 de Agosto de 1945, e a 11 de dezembro de 1949, no Convento de Pamplona (Extramuros), emitiu os votos perpétuos.

Continuou no convento de Barcelos onde fez os estudos de Filosofia (1945-1948), seguindo, depois, para Espanha, a fim de cursar Teologia no Convento de Saragoça (1º ano) e Pamplona (2º e 3º anos), da Província de Navarra (1948-1951). No ano de 1952 fez no Porto algumas cadeiras do 4º ano de Teologia, que foi obrigado a interromper por motivos de saúde, integrando, então, durante um tempo, a comunidade do Seminário de Vale Formoso (Aldeia do Mato), concelho de Belmonte.

Em 1953 colaborou na assistência ao Seminário em Vila Nova de Poiares, em 1956 integrou a Fraternidade do Porto, passando, depois, para a Fraternidade de Lisboa onde, a 4 de fevereiro de 1957, tomou posse como auxiliar da Administração da revista «Bíblica», cujo responsável era o saudoso e benemérito Fr. Inácio de Vegas, ofício que desempenhou em colaboração com um seu conterrâneo, o Frei Miguel de Negreiros.

Aqui permaneceu até Junho de 1966, altura em que foi transferido para a Fraternidade do Porto, onde viveu até à partida para a “Casa do Pai”, o seu dia natalício (“dies natalis”), vivido no amanhecer do dia 14 de dezembro de 2024, a poucos dias da celebração do Nascimento do Deus-Menino em Belém.

O Frei Jorge notabilizou-se pelos muitos e excelentes serviços que prestava à Fraternidade, sempre disponível para ajudar e servir onde fosse preciso, precioso dom maternal ao serviço dos irmãos, como desejava São Francisco de Assis.

Possuía uma intensa vida interior, feita duma fidelidade ao dever de cada dia, revelando aquele espírito de humildade, desprendimento e simplicidade, tão próprios do carisma Franciscano, virtudes que estavam arreigadas numa intensa vida de piedade, vida contemplativa, oração e de união com Deus.

Apesar das limitações de saúde, muitas vezes frágil, revelava a todos um rosto onde brilhava a serenidade e a paz.

Alma profundamente franciscana, o Frei Jorge deixou-nos o legado de um magnífico exemplo de amor à sua vocação e à Ordem Capuchinha, pela qual um dia se apaixonou.

A Missa de "corpo presente", presidida pelo Frei António Martins, Ministro Provincial dos Capuchinhos, e concelebrada por muitos irmãos de todas as Fraternidades em Portugal, foi celebrada no dia 16 de dezembro, às 09h45, na igreja paroquial dos Capuchinhos do Amial, no Porto, seguindo depois para o cemitério da Freguesia de Paranhos.

“Bem-aventurados aqueles
que cumpriram Tua santíssima vontade”.
(S. Francisco de Assis, “Cântico das Criaturas”)

Mais que uma toalha branca

(Frei Hermano Filipe, 14/12/2024)

Ontem à noite, ao saber que a hora do nosso querido Frei Jorge se aproximava, lembrei-me do poema “Missa das 10” de Adélia Prado, prémio Camões 2024, porque, por vezes, a melhor maneira de falar de alguém é dizer o que ela não é:

Frei Jácomo prega e ninguém entende.
Mas fala com piedade, para ele mesmo,
e tem mania de orar pelos paroquianos.
As mulheres que depois vão aos clubes,
os moços ricos de costumes piedosos,
os homens que prevaricam um pouco em seus negócios
gostam todos de assistir à missa de frei Jácomo,
povoada de exemplos, de vida de santos,
da certeza marota de que ao final de tudo
uma confissão in extremis garantirá o paraíso.
Ninguém vê o Cordeiro degolado na mesa,
o sangue sobre as toalhas,
seu lancinante grito,
ninguém.
Nem frei Jácomo.

O Frei Jorge era dos que nunca procurava arrancar aplausos para si próprio e realizou a sua vocação servindo os irmãos, por isso, estou certo, podia ver muito mais do que apenas uma toalha branca estendida sobre o altar.

Acometido de doença grave desde muito novo, não viveu arrastando-se pelos anos com pena de si mesmo, mas encontrou a alegria de ser Capuchinho no dom da Fraternidade e na oração. Não na Fraternidade como construção teórica mas na obediência aos seus superiores e no serviço aos irmãos. Não numa oração alienante, rica em palavras como as do “Frei Jácomo”, mas profundamente encarnada na vida.

Vivi com ele há cerca de 20 anos. Era quase sempre o primeiro a chegar à capela. Muitas vezes o encontrei sozinho, prostrado em adoração. Para ele, a fidelidade passava por coisas simples: tocar o sino para a oração ou a refeição, pôr a mesa para os irmãos, fazer o café…

Há pessoas que passam por nós e cuja vida nos diz muito pouco; outras marcam-nos num tempo e contexto específico; outras ainda, como o Frei Jorge, ajudar-nos-ão com o exemplo até à eternidade. Obrigado Frei Jorge!

Voz Melodiosa

(Frei Dinis de Vilharelho, 14/12/2024)

Quantas vezes, amigo, nesta vida
ouvia a tua voz melodiosa…
Quantas vezes fizemos a subida,
à procura da Estrela luminosa.

Quantas vezes, ouvi os teus conselhos:
essas tuas palavras cristalinas,
que foram para mim como evangelhos,
ofertas como dádivas divinas.

E sempre a tua vida, celebraste
nos teus lábios e humano coração…
e com heroicidade a suportaste,
e oferecestes, ao Senhor, numa oração.

A tua humana e longa caminhada,
espalhou as virtudes entre nós…
foi como um sol depois da madrugada,
foi como um rio que chegou à foz.

Para ti, já chegou a Primavera,
a eterna Primavera, que é só Deus;
o Senhor já estava à tua espera,
para uma nova estrela pôr nos Céus.

Obrigado, por tua companhia,
por essa luz que foi a tá vida,
por esse amor, que sempre nos unia,
e não finda, depois da despedida.

Tu que já vives para além da morte,
e participas já da Eternidade,
para nós pede, a Deus, a mesma sorte:
o Reino eterno da Felicidade.

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